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terça-feira, 13 de setembro de 2011

Sentindo conscientemente

Sentir algo conscientemente é também uma forma de conhecer. Sentir uma emoção conscientemente é o caminho para conhecê-la.

Quando sinto conscientemente uma brisa, estou conhecendo as sensações que ela provoca em meu corpo. Posso conhecer, também, as emoções que a brisa evoca em meu coração pois, quando sinto conscientemente uma emoção, a estou conhecendo.

Sentir algo conscientemente é permitir que aquilo nos chegue à consciência pela via do coração.

O conhecer não vem somente pelo pensar, como supõe a educação acadêmica formal. O pensar nos leva a conclusões, mas o sentir também nos leva a conclusões. Posso chegar a conclusões por meio de associações lógicas de idéias ou por meio do saborear consciente de minhas emoções.

Quando sinto que a presença de uma pessoa me causa mal estar, não estou conhecendo a pessoa em si, mas estou conhecendo a emoção que tal pessoa provoca em mim.

O conhecimento das emoções não resulta de meras especulações teóricas e associações entre pensamentos. Se quero conhecer e compreender minhas emoções, tenho que senti-las conscientemente. Sentir conscientemente uma emoção é algo semelhante a senti-la de propósito, intencionalmente, ainda que sem identificação.

Quando estamos identificados com uma emoção, a sentimos inconscientemente, mas, quando não nos identificamos, podemos senti-la conscientemente. Quando sinto conscientemente uma emoção, identifico (mas não me identifico com) seu teor qualitativo.

O teor qualitativo de uma emoção não pode ser definido e nem descrito com exatidão, pois escapa à linguagem e ao intelecto. Mas pode perfeitamente ser saboreado pela consciência, o que se consegue quando a mesma é sentida de forma consciente.

O problema das emoções e sentimentos obsessivos pode ser aliviado mediante o sentir consciente (mas isso não é tudo, pois a superação requer que se deixe de alimentá-las a todo instante).

Em outros termos, sentir as emoções conscientemente é praticar a auto-observação no centro emocional. Ilógico, absurdo, desproposial e sem sentido seria tentar observar as próprias emoções enquanto se as bloqueia, como alguns estudantes gnósticos tentam fazer. Não poderei observar e compreender os movimentos de um dançarino ou o comportamento de um pássaro se o imobilizo. Do mesmo modo, não poderei capturar o sentido (teor qualitativo) de uma emoção se a bloqueio.

Compreender as emoções difere de compreender os pensamentos. Compreendemos os pensamentos quando observamos o que se passa dentro de nossa cabeça (como se faz durante o pratyahara) e compreendemos as emoções quando observamos o que se passa no coração. Por "observar" entenda-se: receber conscientemente, sem rejeição.

Temos sido condicionados, desde a infância, a tentar imobilizar as emoções que consideramos ruins. O resultado é que praticamos muitos recalques inconscientemente. A cultura ocidental é a cultura do recalque cultivado há milênios, daí a oscilação constante entre o moralismo e o hedonismo. Precisamos transcender este par de opostos.

Nossa consciência pode perceber o que se passa no mundo que nos rodeia e o que se passa em nós. Quando praticamos a auto-observação, estamos "recebendo o ego na consciência", ou seja, recebendo nossa pessoa, quem somos, de forma aberta, para investigá-la e conhecê-la. Observar-se é receber os próprios pensamentos, os próprios movimentos e as próprias emoções. Quando nos recusamos a receber uma emoção conscientemente, ela se torna obsessiva ou extravasa por meio de doenças psicossomáticas. Se queremos a tranquilidade emocional, temos que aprender a "sentir o que estamos sentindo", sentir conscientemente. A serenidade assombrosa dos Budas não é algo que se consegue simplesmente querendo. Não basta somente querer e nem tentar ser calmo. A serenidade dos Budas resulta de um longo trabalho ao longo de existências. Forçar ou fingir serenidade é perigoso e prejudicial. A verdadeira serenidade não é forçada.

Sentir conscientemente uma emoção é senti-la na consciência, não é identificar-se com ela, para desfrutar do seu sabor, nem evocá-la em sua ausência e nem tampouco procurá-la quando não está nos molestando. Quando nos identificamos com uma emoção, a fortalecemos mais e mais e nos tornamos ainda mais escravizados. Há que se diferenciar o sentir consciente do sentir identificado. Sentir conscientemente é "sentir o que se está sentindo".

Sentir as emoções conscientemente não é o mesmo que estar alimentando-as a todo instante por meio da identificação, nem ficar todo o tempo lembrando daquela emoção, nem procurá-la quando estiver ausente e nem tampouco provocá-la quando não estiver nos molestando. O sentir consciente não é entrar na frequência das emoções negativas, dos desejos, medos e tristezas, não é sintonizar-se com o Ego. É algo distinto: percebê-lo em ação, dar-se conta.

O sentir consciente se aplica às emoções invasivas e compulsivas, que já estão fazendo estrago e das quais não podemos escapar (ex. o nervosismo em uma discussão que já está sendo travada).

Temos que identificar a emoção, mas não nos identificarmos com ela. Identificar uma emoção difere de identificar-se com a emoção. Identificar uma emoção é discernir qual é a emoção que está no assaltando. Identificar-se com a emoção é misturar-se com a emoção, encontrar-se na emoção, confundir-se com a emoção, considerar que a emoção não é algo alheio, estranho à consciência e ao Ser.

Enquanto percebemos conscientemente uma emoção que nos invadiu (porque anteriormente a alimentamos e lhe demos espaço), é claro que temos que orar à Mãe Divina para que a mesma seja dissolvida. O ideal, entretanto, é não permitir que as coisas cheguem a esse ponto, atuando bem antes sobre a manifestação do ego correspondente. Observando-nos, descobriremos pequenas e sutis reações emocionais a todo instante, no dia a dia. Se as sentirmos conscientemente e orarmos, elas são dissolvidas ali mesmo e não abrirão as portas para outras emoções mais violentas. Mas, se nos identificamos previamente, por descuido, e já estamos invadidos, não há remédio além de observá-las, orar e contemplar os resultados. A aplicação da dualidade aos pensamentos insistentes que as acompanham também é de grande ajuda.