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segunda-feira, 28 de maio de 2012

Concentração: preenchendo a mente com conteúdos superiores


Vamos voltar um pouco ao assunto dos conteúdos mentais.

A mente pensa com facilidade no aspecto negativo e sinistro da vida, nele se concentrando com extrema facilidade. Qualquer pessoa que tenha um problema grave sabe do que estou falando. A concentração da mente nos problemas e desgraças faz com eles aumentem de forma espantosa, o que leva pensamentos e emoções ruins a tomarem conta do cérebro, do sistema nervoso e do corpo. Ocupar-se com os maus pensamentos para tentar erradicá-los não é um bom negócio. Melhor é ocupar-se com pensamentos elevados.

Um motivo pelo qual a mente se ocupa facilmente com o mal é a crença inconsciente de que se pode atenuá-lo através de tal procedimento.  A mente realmente acredita que é necessário pensar nas coisas ruins para melhorá-las. Quanto mais pensarmos no mal, mais afundaremos em pensamentos negativos.

Sintonizar-se com os aspectos superiores da vida e do universo é possível quando pensamos no que é superior ao invés de pensar no que é inferior e terrível.


A mente humana pode ser considerada como a substância ou matéria (manas) que compõe os pensamentos e imaginações. Os conteúdos dos pensamentos são adquiridos ao longo da vida, desde a infância. Isso significa que aquilo que se passa em nossa cabeça é resultado de múltiplas e infinitas combinações de elementos capturados sensorialmente e retidos na cabeça, sob a forma de representações.

Quem prestar atenção em seus próprios pensamentos perceberá que são constituídos principalmente por imagens de tipo visual e por representações de tipo sonoro. "Vemos" e "ouvimos" cenas e acontecimentos na tela da mente.

Se ficarmos um dia inteiro passeando em uma praia, à noite perceberemos imagens mentais da areia, das ondas. Se passarmos o dia em uma floresta, as imagens serão de árvores, de folhas e coisas assim. Quando algo nos impressiona muito, seja positivamente ou negativamente, imagens correspondentes ficarão em nossa mente. Basta fecharmos os olhos e as veremos, pois tais imagens podem ser vistas pela clarividência incipiente que todas as pessoas comuns possuem.

Algo similar acontece com os sons. Os sons que ouvimos na vida formarão pensamentos "sonoros", sendo sua principal forma a tagarelice interior. Nas cenas mentais, nós falamos e outras pessoas falam. A mente imagina milhares de situações em que discursamos, discutimos, conversamos, perguntamos, brigamos etc. Tais pensamentos usam o recurso do idioma (português, inglês, francês etc.) para se processarem. Um latino-americano pensará em espanhol ou português. Um oriental pensará em árabe, japonês, chinês ou sânscrito. O idioma aprendido desde a infância serve como base para a tagarelice inútil da mente.

Além das tagarelices internas, merecem destaque as músicas insistentes que invadem a mente e "ficam na cabeça". Às vezes tais músicas se repetem por dias a fio, sem dar descanso. Tais músicas entraram na mente no momento em que as ouvimos e nos identificamos. Em geral, são músicas que detestamos ou das quais gostamos muito. Uma música pela qual nutrimos indiferença dificilmente se fixará na cabeça. Um bom antídoto para o problema é ouvirmos os sons da natureza por um longo tempo, deixando que impregnem a mente. Mantrans vocalizados por longo período também costumam ajudar. O que importa é substituir os sons indesejáveis pelos desejáveis.

Os sons mentais são recordações de sons ouvidos ao longo da vida, sob múltiplas combinações. O silêncio mental é a ausência de sons mentais. Um surdo de nascimento não terá tagarelices interiores e nem ouvirá sons mentais, embora tenha muitas representações mentais de conteúdos visuais.

O silêncio absoluto da mente somente é alcançado no samadhi. Na concentração existe um silêncio relativo. Os sons mentais não são os autênticos sons dos mundos internos, são projeções. Os verdadeiros sons dos mundos internos estão além dos sons mentais e da tagarelice mental. No entanto, os sons e as imagens percebidos durante a fase da concentração servem como guia, como barco para atravessarmos o oceano da mente e depois descartá-lo. As imagens internas com sons não-verbais se convertem, após a fase da concentração, em visões.

Portanto, aquilo que nos impressiona se transforma em conteúdo mental e imaginativo. Convém prestarmos atenção e tomarmos cuidado com o que presenciamos, vemos e vivenciamos. Se queremos aprender a nos concentrar e a meditar, não podemos encher nossa mente com lixo.

Se eu passar um dia inteiro presenciando cenas inferiores e negativas, sejam ao vivo, no computador ou na televisão, à noite não poderei me concentrar em outras coisas. As cenas com que preenchi minha mente irão atormentar durante a prática. No entanto, se eu passar o dia andando em uma praia, à noite poderei me concentrar com certa facilidade em praias e até ter alguns sonhos relacionados. Tudo terá sido voltado para a mesma direção. Temos que aprender a direcionar a mente e parte deste trabalho consiste em cultivar nela aquilo que nos interessa espiritualmente.

Uma das chaves para a concentração é o esquecimento de tudo. Não poderemos esquecer algo se o ficamos cultivando durante a vida.

Sempre que alguém pensar muito em algo, sentirá emoções correspondentes. Se pensar em algo ruim, sentirá emoções e desejos ruins e baixos. Se pensar em algo bom e superior, sentirá emoções elevadas e superiores.

Quando aprendemos a pensar em uma só coisa por um tempo prolongado, o pensamento único toma conta da mente. Emoções correspondentes ao tema pensado são sentidas e, em etapas profundas, nos unimos ao objeto.

O tema da concentração pode e deve ser algo bom que nos interesse: o Senhor Jesus, o Senhor Buda, o Senhor Krishna, o sol, o céu. Podem também ser temas abstratos, como a nossa origem e destino.

Em uma primeira etapa, somente pensamos no tema. Posteriormente, percebemos imaginativamente o objeto de forma nítida e sentimos vivamente as emoções correspondentes. Por último, ultrapassamos a distinção que nos separa do objeto. Tudo é questão de aprender a deixar que um pensamento único tome conta da mente, a impregne. O pensamento único é como uma porta que é atravessada quando é alcançada.

A capacidade de concentrar o pensamento, uma vez desenvolvida, pode ser direcionada a qualquer objeto sensível ou lugar. Posteriormente, pode ser direcionada àquilo que nos parece abstrato: o Atman, Deus ou Espírito Divino no homem.

Enquanto estivermos presos à mente, haverá necessidade de algo em que pensar. Somente quando escapamos da mente é que tais conteúdos se tornam desnecessários. Escapamos da mente durante o samadhi.

Neste universo fenomênico e relativo no qual vivemos, temos que pensar em coisas boas ou então pensaremos em coisas ruins. No entanto, além dos bons pensamentos da concentração, está o não-pensamento do samadhi. O não-pensamento autêntico é a forma mais elevada de pensar que existe.