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quinta-feira, 1 de março de 2012

Fixar-se no trabalho de não alimentar

Aquilo que estimulamos e cultivamos em nossa alma, toma força e se desenvolve, seja bom ou mal.

Atos e pensamentos insuspeitados cultivam valores e tendências, virtuosos ou defeituosos.

Convém aplicar a auto-observação sob a perspectiva do reforço, perguntando-nos: "o que estou reforçando agora, com este ato, fala ou pensamento?". Quando nos mantemos em expectativa contínua a respeito do que podemos estar alimentando, descobrimos milhares de detalhes dos nossos defeitos. Todo defeito se alimenta pelos detalhes da conduta.

Quando pensamos em algo, visualizamos imagens na tela de nossa mente. As imagens visualizadas, quando nos identificamos, poderão reforçar desejos. Os pensamentos são a principal, mas não a única, forma de darmos energia aos egos.

Estarei reforçando um desejo se me entreter "curtindo" o prazer de contemplar a imagem física do objeto ou a imagem mental do objeto. Reforço a luxúria quando fico olhando para mulheres lindas e desejáveis, mas também quando penso nelas. Em ambos os casos há um certo prazer mórbido, uma sensação prazeirosa que vicia e nos torna impotentes.

Se fico pensando em determinada situação, identificado com as múltiplas imagens que desfilam em minha mente, reforçarei alguns defeitos relacionados àquilo. Se cultivo pensamentos a respeito de meu inimigo, reforçarei o ódio, a ira e outros defeitos aparentados.

Temos que nos fixar na compreensão de que o fundamental, na Morte do Ego, é suspender a nutrição. Quem medita em determinado defeito com o intuito de compreendê-lo, mas não deixa de alimentá-lo em outros momentos, está andando em círculos, não pode avançar, pois está sabotando o seu próprio trabalho.

As formas de alimentarmos um defeito são inúmeras, mas não as vemos todas porque são inconscientes. A auto-observação permite jogar luz nas trevas da inconsciência.

Podemos reforçar um defeito por meio de pensamentos, mas também por meio de falas, atitudes, movimentos, formas de vestir, olhares, tons de voz etc.

Vejamos um exemplo. Você estará reforçando a luxúria quando:

  1. contemplar as mulheres desejáveis;
  2. conversar maldosamente sobre sexo com um amigo;
  3. pensar em sexo;
  4. assistir filmes pornográficos;
  5. cultivar fetiches e fantasias sexuais.

Os fracassos no maithuna e na transmutação da energia resultam do cultivo anterior da luxúria, são o seu produto final. Tentar reverter o produto final sem modificar os fatos que o originam é infrutífero. Os sintomas servem para chegarmos às causas, assinalam a origem, mas não devemos nos ocupar com os sintomas e nem tentar revertê-los, temos que atuar sobre as causas (estou me referindo agora às causas de manifestação neste mundo tridimensional e não ao Eu-causa). Atuamos sobre as causas quando aplicamos a Morte em Marcha.

Mas para atuarmos sobre as causas temos primeiramente que descobri-las e as descobrimos por meio da auto-observação. Neste texto, causa é sinônimo de canal de alimentação, os canais de alimentação são as causas às quais estou me referindo.

Quando nos mantemos receptivos, percebemos se determinados atos ou pensamentos estão ou não reforçando algum defeito. Não basta simplesmente descobrir um defeito, temos que descobrir por onde o alimentamos, como o cultivamos.

Cultivamos o Ego sem nos darmos conta, pois vivemos distraídos com as coisas mundanas e não prestamos atenção em certos pormenores cruciais da nossa vida psicológica.

Sofremos muito com os diversos desejos, emoções negativas e defeitos mas, paradoxalmente e de forma absurda, os alimentamos a todo momento.

Há defeitos violentos, muito fortes, que nos sacodem e arrastam, parecem todo-poderosos. São defeitos que estão exageradamente arraigados em nossa personalidade porque foram alimentados de forma intensa e descomunal. De nada adianta nos debatermos, o indicado é suprimir a alimentação e aguardar o enfraquecimento.

Embora reprimir seja contra-indicado, temos que aprender a viver "fora do Ego" e não dentro dele. Vivemos dentro do Ego quando estamos identificados. Quando nos identificamos com o Ego, nos tornamos indistintos. Em tais situações, ou o satisfazemos ou o reprimimos. É, porém, uma ilusão acreditar que os desejos reprimidos não se satisfarão por canais alternativos. Em casos extremos, os desejos reprimidos se satisfarão através da somatização de doenças.

O trabalho com os canais de alimentação (que são os detalhes do Ego) é fundamental e não pode ser abandonado. Aquele que almeja morrer e abandona este trabalho, se desvia para os labirintos da confusão. Nos momentos de desorientação e tentação rigorosas, temos que nos recordar deste trabalho, que é o nosso guia fundamental.

Há pessoas sinceras que gastam o tempo correndo atrás dos seus próprios defeitos, sem se darem conta de que assim os estão fortalecendo.  Quem almeja se libertar dos próprios defeitos, deve deixar de alimentá-los, o que inclui não pensar nos mesmos, ainda que seja para condená-los e recriminá-los. Podemos pensar em um defeito de forma favorável ou desfavorável, para justificá-lo ou para condená-lo. Em ambos os casos estaremos identificados e o alimentaremos.