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domingo, 29 de maio de 2011

Aprofundando a concentração

Quando tentamos praticar o relaxamento, a concentração e a meditação e não obtemos nenhum resultado transcendental, a causa do fracasso pode estar na falta de sono.

Em vigília, podemos penetrar nas regiões do inconsciente somente até um determinado nível, além do qual se requer o sono, que é a desaceleração das funções biológicas e cerebrais. O sono abre as portas ao Além.

Após o relaxamento ter avançado razoavelmente, iniciamos a concentração, mas isso não significa que, ao aprofundarmos esta última, aquele não prosseguirá se aprofundando ainda mais. O início da concentração marca um aprofundamento maior do relaxamento e da desaceleração das funções biológicas. Tudo isso é sono cada vez mais profundo, porém consciente.

O aprofundamento da concentração, por sua vez, requer o aprofundamento do sono e o desligamento dos sentidos físicos. A percepção do corpo físico cessa progressivamente, ao passo que a percepção interior consciente daquilo em que nos concentramos aumenta, na mesma proporção.

Se nos concentramos em um elemento exterior, o som de um grilo, por exemplo, deixaremos de percebê-lo fisicamente e passaremos a percebê-lo interiormente, cada vez com mais clareza. Aquilo que nos atinge sensorialmente também nos atinge supra-sensorialmente, ao mesmo tempo.

Deste modo, aprofundar a concentração, durante a prática da meditação, é clarificar a percepção do objeto interior ou exterior que nos interessou.
Se o objeto de nossa concentração for um mantram, inicialmente o perceberemos sensorialmente (o pronunciaremos fisicamente, verbalmente)e posteriormente o perceberemos supra-sensorialmente, pois o pronunciaremos mentalmente. Existem as percepções exteriores e interiores.

Podemos começar a concentração a partir de um elemento percebido sensorialmente (exteriormente) ou supra-sensorialmente (interiormente). Quando percebemos algo interiormente, diz-se que estamos no pensamento único ou na imaginação consciente, o que é a mesma coisa. O pensamento único ao qual os mestres se referem é a percepção interior do objeto de nossa concentração, a qual requer o abandono da correspondente e limitada percepção exterior, a qual nos restringe à uma percepção tridimensional do objeto. Se ficássemos presos à percepção exterior ou sensorial, não penetraríamos na realidade do alvo de nossa concentração, pois a mesma transcende o tridimensional. Portanto, a percepção tridimensional do objeto é parcial e temos que ir além dela, transcendendo-a, o que se consegue quando a alma vai se desligando do corpo físico.

Ao longo do processo, podem surgir pensamentos que nos distraiam e atrapalhem, desviando-nos. Como almejamos o pensamento único, pensamentos que não tenham nada a ver com o objeto de nossa concentração nos afastam da meta. A recomendação dos mestres para esses casos é que não entremos em confito com tais pensamentos e sim nos detenhamos por um momento para assimilar seus conteúdos, isto é, para nos tornarmos conscientes do que contém. Se entrarmos em conflito, nos prendemos em uma luta e a prática estanca, não avança, pois ficaremos envolvidos em um combate sem fim. O conlito com os pensamentos é uma forma de identificar-se com a mente.

Se dissecamos o conteúdo do pensamento intruso, sem conflitar, o aquietamos e podemos então prosseguir rumo ao silêcio, aprofundando a concentração. Se um pensamento invasor surgir novamente, seja o mesmo ou outro, temos que interromper novamente a concentração para nos fazermos conscientes do seu conteúdo, seu assunto e sua meta. Todo pensamento possui um conteúdo, traz algo dentro de sim: temas, cargas de libido e metas. O pensamento provém de um "eu" que quer algo. Quando o pensamento é assimilado, deixa-nos em paz e podemos prosseguir, aprofundando ainda mais a concentração.

Assim vamos caminhando rumo às profundidades da psique.

O trabalho aqui descrito poderia ser comparado a dirigir por uma estrada. Você está dirigindo, rumo ao que está além do horizonte. De repente, um problema acontece com o seu carro. Você para, verifica qual é o problema, conserta-o e prossegue. Posteriormente surge outro e você faz o mesmo. E assim prossegue.

Diz o mestre que chega um momento em que todos os pensamentos se esgotam, então vislumbramos o mundo que estava além das montanhas mais distantes. É quando então podemos abandonar o pensamento único, que é o último que restou, para cairmos no vazio e experimentarmos o indescritível.

O V.M.S. diz que "a procissão dos pensamentos cessa". Essa procissão é composta pelos pensamentos que vão esporadicamente interferindo na concentração. Não se trata de um conjunto de pensamentos encadeados, que devem ser observados enquanto passam para, somente depois, nos preocuparmos com a concentração. Se nos detivermos somente contemplando os pensamentos, deixando definitivamente a concentração de lado, simplesmente dormiremos e sonharemos. Não se trata de ocupar-se somente em contemplar conscientemente os próprios pensamentos (algo assim como assistir a uma televisão) pois o resultado inevitável seria o adormecimento da consciência. A "procissão de pensamentos" é constituída pelos pensamentos que vão esporadicamente se intrometendo na concentração, para desviá-la.

Muitas pessoas poderiam supor que a primeira etapa da meditação consiste em contemplar conscientemente os próprios pensamentos, deixando a concentração de lado. Se apenas contemplarmos os pensamentos, sem penetrar através deles com a concentração em nos interessa, levaremos a consciência somente até um nível, além do qual adormeceremos normalmente e teremos sonhos.

Importa, então, aprender a aprofundar o sono enquanto se intensifica a lucidez e a consciência, o que requer focalização da atenção em um objeto. Apenas contemplar os pensamentos é não ter objeto definido algum para a atenção e, portanto, para o campo da consciência.

Durante a concentração, não devemos procurar os pensamentos, buscando onde eles estão ou checando se estão surgindo. Tampouco devemos reprimi-los. O estado ideal é um estado em que não os reprimimos, se surgirem, mas também não os estimulamos e nem os buscamos, caso não estejam aparecendo. Apenas aquilo em que nos propomos a prestar atenção é que deve nos interessar.

O empenho em prolongar a atenção/pensamento único pelo maior tempo possível e o maior número de vezes possível por dia resultará em aprofundamento crescente e desenvolvimento da concentração, até o ponto em que ocorra o esquecimento(vairagya) total de tudo o que existe. 

2 comentários:

  1. Estimado amigo, bom dia.
    Na prática da concentração, posso direcioná-la para o som de uma música oriental (Daquelas que relaxam e fazem-nos refletir sobre a vida), por exmeplo?

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  2. Sim, com certeza. Você pode dirigir a concentração para qualquer objeto no qual queira penetrar supra-sensorialmente.

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