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terça-feira, 18 de agosto de 2009

Repressão: um erro a ser evitado

Temos um problema filosófico difícil. Por um lado, entregar-se à satisfação dos impulsos é o mais rápido caminho para a perdição. Por outro, resistir à satisfação é o mais rápido caminho para a somatização de doenças e para a dissociação neurótica. Qual seria a solução? Uma terceira via, normalmente desconsiderada: a transformação do impulso em neutralidade. Há que se entender claramente este ponto para se evitar confusões que poderiam resultar em desvios nefastos.

Um incauto poderia concluir que defendemos a satisfação dos desejos como forma de dissolvê-los. Tal idéia nos parece absurda pois a satisfação os fortifica, ao invés de enfraquecê-los. A satisfação ocorre via identificação e afasta o defeito somente temporariamente, tornando-o ainda mais despótico em momentos seguintes.

Aquele que remove os mecanismos de repressão do ego cairá sob seu domínio, caso não lance mão imediatamente de outras armas para contê-lo de forma eficiente. Importa entender que não estamos sugerindo a entrega ao desenfreio dos desejos sob a desculpa de observá-los. Estamos propondo a substituição do mecanismo repressivo por meios realmente funcionais de transmutação do desejo em neutralidade (liberdade da alma). Os meios consistem, primeiramente, em manter-se alerta em tempo integral para não nutrir os defeitos e, secundariamente (isto é, quando falhamos na adoção do primeiro), na ruptura da identificação com o elemento obsessor. Em ambos os casos, a observação de si e a oração às partes superiores do Ser são imprescindíveis.

Propomos, portanto, a substituição da repressão por um meio muito mais eficiente para a transformação e o resultante domínio de si.

É uma perda total de tempo analisar e refletir sobre um defeito se o estamos reforçando no dia a dia. Importa, então, encontrar os caminhos insuspeitados pelos quais os reforçamos, para assim dissolvê-los. A mera recordação de um impulso compulsivo leva-lhe energia e resulta posteriormente em obsessão.

Combate-se a obsessão combatendo-se os comportamentos que a nutrem. De nada adianta debater-se uma vez que esteja instalada se logo em seguida a reforçarmos novamente. O caminho começa, portanto, pelo cuidado em não as alimentarmos (daí a auto-observação e a morte em marcha). No entanto, aqueles que estão tomados por um agregado psíquico devem também dispor de um meio que lhes permita sair de tão horrível estado. Aqui entra em ação a auto-reflexão, a qual somente será funcional se a pessoa não voltar a nutrir o defeito obsessor tão logo se veja livre dele. É desnecessário dizer que somente a Mãe Divina tem o poder de dissolver o elemento obsessor, transformando-o o em virtude. Não menciono isto todo o tempo para não ser repetitivo, mas o leitor deve considerar que estamos pressupondo o apelo à Ela todo o tempo.

Relacionar-se com a Mãe Divina é uma questão de amá-la,assim como a outras partes do Ser. O amor a Deus é fundamental para a evolução espiritual. Temos que chegar a amar a Deus mais do que ao mundo, ao corpo e a nós mesmos, somente assim nos unimos a Ele para sempre. Em nosso atual estado, amamos muito mais ao mundo, à matéria, do que ao Ser.

Aceitação

Temos que trabalhar a aceitação da realidade. Não adianta nos pressionarmos contra aquilo que somos. Ao invés disso, é melhor nos compreendermos. Há uma diferença entre compreender o ego para dissolvê-lo e tentar sufocá-lo.

Eus bons

A tentativa de sufocação dos defeitos (recalque) é realizada por eus bons que cobiçam virtudes. São esses eus que originam neuroses através da auto-cobrança, auto-pressionamento, auto-condenação, auto-depreciação e auto-exigência. Os eus bons são, portanto, extremamente perigosos e podem ocasionar doenças. Por trás da virtude aparente de tais eus podem existir objetivos egoístas. A morte deve também se efetuar sobre tais elementos daninhos.

Delegar à Mãe Divina

Deixemos a responsabilidade da morte com a Mãe Divina. Façamos a nossa parte: vigiar e orar.

Essas palavras do V.M. Samael ilustram bem a idéia deste post sobre o vício de resistir aos desejos e tentar reprimi-los:

"A resistência é a força opositora. A resistência é a arma secreta do ego.

A resistência é a força psíquica do Ego, que se opõe à que tomemos consciência de todos os nossos defeitos psicológicos.

Com a resistência, o Ego tende a sair pela tangente, postulando desculpas para calar ou tapar o erro.

Por causa da resistência, os sonhos tornam-se difíceis de interpretar e o conhecimento que se quer ter sobre si mesmo torna-se nebuloso.

A resistência atua como um mecanismo de defesa, que trata de omitir erros psicológicos desagradáveis, para que não se tenha consciência deles e se continue na escravidão psicológica.

Mas, na realidade e de verdade, tenho de declarar que existem mecanismos para vencer a resistência e são os seguintes:

1- Reconhecê-la.
2- Defini-la.
3- Compreendê-la.
4- Trabalhar sobre ela.
5- Vencê-la e desintegrá-la por meio da super-dinâmica sexual.

Mas o Ego lutará durante a análise de resistência para que não sejam descobertas suas falácias, o que põe em perigo o domínio que ele tem sobre a nossa mente.

Nos momentos de luta com o Ego, há que apelar a um poder superior à mente: o fogo da serpente Kundalini dos hindus."

(Samael Aun Weor - A Revolução da Dialética, cap. 4)

A questão da resistência ao ego é da maior importância. Muitos estudantes adquirem o vício de simplesmente resistir aos desejos ao invés de estudá-los. Tentam, por meio do simples esforço sem critério, “não sentir o desejo”. Esta é uma forma de auto-agressão, de um equivocado esforço contra si mesmo, cujos resultados são as neuroses e doenças emocionais mais graves. Esse não é o caminho da morte do ego.

Ao invés de perdermos o tempo nos auto-agredindo com esforços indevidos e com o inútil hábito de resistir aos desejos, é melhor nos separarmos dos defeitos, observá-los em ação e suplicar por sua morte à Mãe Divina.

O mecanismo da resistência ao desejo está ligado à culpa e a culpa está relacionada com o medo. Diante do temor das consequências da satisfação de um desejo avassalador que não é aceito socialmente, a pessoa imediatamente faz esforços para sufocá-lo, bloqueá-lo, pois não conhece a didática para correta para a sua morte. A pessoa que não conhece a didática da Morte está à mercê dos defeitos.

Há em qualquer um de nós (inclunido os moralistas politicamente corretos que vivem criticando o próximo ao invés de criticarem a si mesmos) egos perigosíssimos, que podem destruir completamente a nossa vida e a vida de outras pessoas. São desejos intensos que podem nos levar a cometer crimes, atos socialmente reprováveis e punidos com medidas cruéis e severas. Diante de um tal perigo, é normal que as pessoas optem pelo caminho mais curto da repressão ou recalque, aperfeiçoando sua capacidade de simplesmente resistir e sufocar as paixões e emoções.

No entanto, o hábito de resistir aos defeitos é também um defeito, corresponde a uma forma encontrada pelo ego para evitar ser alvo da análise consciente. Se prestarmos atenção, veremos que, quando resistimos a um desejo, não fazemos mais nada, não o observamos e nem tampouco pedimos. Como poderíamos observar aquilo que banimos da nossa vista? Resistir a um desejo é “empurrá-lo para dentro”, de volta ao inconsciente, retirando-o de nosso campo de visão, expulsando-o do campo da consciência.

Expulsar um desejo do campo de visão não é matá-lo. O inimigo continua vivo e ativo dentro de nós, agora por baixo de nossa zona de auto-percepção consciente, não sendo captado pela auto-observação. Se eu expulso meu inimigo do meu campo de visão, jamais poderei estudá-lo e compreendê-lo. Não se mata um defeito através de resistências. A resistência é a opção por um pólo em detrimento do outro, é a opção por um desejo, socialmente aceitável e louvável, em detrimento de outro desejo, socialmente reprovável e condenável.

Ocorre, entretanto, que o ego jamais poderá matar o ego. De nada adianta optar por um pólo (um desejo) porque o outro pólo (o desejo contrário), continuará existindo. Muitos religiosos contemporâneos, desesperados para se livrarem do pecado, optam por pela via nefasta da resistência e vemos como eles sofrem, tentando resistir aos desejos e sendo por eles atormentados durante toda a vida, chegando algumas vezes a cometerem aberrações.

Se você faz muitas “coisas feias” e tem uma grande besta escondida no armário, não perca o seu tempo se sentindo culpado por tais monstruosidades. Isso nada tem a ver com o verdadeiro arrependimento (se fosse arrependimento verdadeiro, você nunca voltaria a fazer aquilo) e é, na verdade, um mecanismo dos egos para te enganarem e continuarem existindo. Aproveite o seu tempo observando e pedindo para a Divina Mãe a morte dos milhares de detalhes. Observe os resultados, você verá que as coisas mudam. Lembre-se que o trabalho de Morte é Ela quem realiza e não você, mero mortal do lodo da terra.

A Morte é tarefa da Mãe Divina. Devemos deixar essa tarefa com Ela e não tentar usurpá-la. Nos mantenhamos em nosso posto, no posto que nos corresponde, e façamos a nossa parte.

A Mãe Divina é o apoio e a arma do estudando, do neófito. Sem Ela, nenhum progresso é possível na Morte do Ego. Aquele que quer morrer deve apoiar-se na Mãe Divina. Não apoiar-se nEla, não rogar-Lhe, é ser ingrato.

O ato de delegar a morte de um defeito à Mãe Divina é o único ato que pode substituir o vício da resistência. Tentar a morte por si só, sozinho, é começar fracassando.

Os mecanismos de resistência são defeitos que devem ter seus detalhes observados e eliminados. Devem ser tratados como quaisquer outros defeitos.

Os mecanismos de resistência são muito queridos pelas pessoas que tiveram uma educação dentro das religiões confessionais. Se não forem compreendidos e dissolvidos, a Morte não avança. As pessoas temem eliminar seus mecanismos de resistência, pois acreditam que, se o fizessem, se tornariam vulneráveis a possessões. O medo é injustificado, pois a invasão violenta de paixões apenas ocorrerá se a pessoa optar pelo pólo contrário (buscando satisfazer o desejo contido) e não é, de modo algum, isso o que estamos defendendo. Não defendemos a opção por nenhum dos lados: nem pelo lado da resistência e nem tampouco pelo lado contrário à resistência, que é o da satisfação do desejo ao qual se resiste. Propomos uma terceira via: renunciar à batalha de opostos, esquecer o processo de opção, e nos ocuparmos em observar receptivamente, sem emitir juízos, conceitos, condenações ou absolvições apriorísticas. Quem alimenta um desejo está tão equivocado quanto quem resiste a ele. Em ambos os casos, o ego sobrevive.

Devemos dar tempo ao tempo e não nos pressionarmos para resistir. Quem reprime não observa. Se eu reprimo alguém, como poderei observá-lo em ação?

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